terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Mais uma pérola da gerência de turno do Rio



Saiu ontem no Globo online a mais nova e genial idéia do gerente Cabral e seu comparsa, Beltrame, com aplausos e assobios da imprensa. A demagogia da vez é dobrar a premiação dos policiais que matarem menos “bandidos”. Quem cumprir as “metas” receberá R$ 3.000,00 ao final do semestre. No pódio da demagogia tem até segundo e terceiro lugar: R$ 2.000,00 para o segundo colocado e R$ 1.500,00 para o terceiro. Como é o calculo? Mate até cem vagabundos e ganhe três mil? Mate até 200 e ganhe dois mil? Será que essa “nova postura” do governo se deve a falta de espaço para amontoar os cadáveres produzidos pela polícia?
E o governo vem com mais essa num dos momentos mais sanguinários do Rio. É a militarização das favelas com as ditas UPP’s; a montagem de um regime de exceção no Complexo do Alemão e na Vila do Cruzeiro; a contratação de mais policiais do que médicos e professores; a remoção de favelas; o choque de ordem etc etc etc. E o mais triste é que o governo e a mídia estão conseguindo forjar uma base social significativa, que assiste e aplaude as políticas fascistas nas suas TVs de plasma dentro de condomínios fechados e com cerca eletrificada nos muros.

domingo, 26 de dezembro de 2010

Feliz Natal



Ho Ho Ho, que bom Natal. Mais de 2000 anos após o nascimento de Jesus seu sucesso e generosidade são imensos. O Papai Noel, muito bom e justo velhinho, presenteou o comércio com 20% de lucro a mais do que no Natal passado. Pelo visto, os patrões se comportaram direitinho esse ano; continuem assim e quem sabe ano que vem o presente seja de 30% a mais nas vendas. Já pensaram nisso? Que beleza! É a fé alheia financiando a sobrevida do Capitalismo moribundo.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Meu primeiro ano na UERJ



Em 2008 ingressei no cursinho pré-vestibular com o romântico objetivo de conquistar uma vaga na Universidade “pública”. Após dois anos, finalmente consegui realizar o tão sonhado objetivo. Agora, ao fim do meu primeiro ano na Academia, é legítimo fazer um balanço.

A palavra decepção talvez seja a que melhor defina meu sentimento; decepção com a organização do curso de Geografia especificamente e com a Universidade em geral; decepção com os professores...

Sobre o curso de Geografia...

Ao longo deste ano percebi algumas coisas escabrosas. O curso parece estar entregue às moscas, se fosse um balde d’água acho que daria dengue de tão parado e monótono, as discussões são parcas; a única discussão que deu uma agitada foi a referente a reestruturação curricular que a direção do instituto quer e está levando a cabo (ao que tudo indica, a reestruturação visa adequar melhor o currículo às necessidades do exigente mercado); faltam verbas para trabalho de campo; banheiros em péssimas condições; carroças nos lugares dos computadores no laboratório; ar-condicionado pifado etc etc etc...

Mas essas coisas que citei são futilidades perto de outras, como a terceirização dos docentes e pessoal administrativo e a certa inutilidade do curso. A terceirização já não é novidade e avança a passos largos na Universidade, pois reduz custos com mão-de-obra, o que gera vários problemas, como precarização das condições de trabalho. Sobre a certa inutilidade do curso, não digo que seja um peso morto, algo que deva ser extinto, não se trata disso. Digo que é inútil para aqueles que mais necessitam se apropriar dos conhecimentos produzidos na Universidade, o povo, em especial aqueles que moram próximo. Entretanto, a relação do curso não é com a população vizinha, mas sim com empresas que ficam sei lá onde e cujos interesses conhecemos bem.

Sobre os professores...

São, em geral, reacionários. Ficam empoleirados nos seus diplomas de doutores, achando que são os maiorais... doce ilusão. Também é evidente a má vontade que têm em ministrar aulas para alunos de graduação; segundo um dos professores (não reacionário), os docentes não gostam de dar aulas para a graduação porque conta pouco ponto na espécie de ranking acadêmico, é melhor ensinar alunos de pós-graduação... se for doutorado então, nem se fala.

Sobre a Universidade...

O contexto relatado é, obviamente, parte de uma história maior, se insere no contexto universitário e, em última análise, é parte indissociável da educação brasileira como um todo. Mas o que me interessa aqui é o contexto da minha Universidade. Em linhas gerais, os problemas do meu curso são os problemas dos demais cursos, com raras exceções.

O governo do Estado destina uma verba irrisória para a Universidade, e a cada ano diminui, descumprindo a Constituição Estadual. E olha que o Reitor é amiguinho do governador! Logo, vai pouco dinheiro para os cursos, com exceção de algumas vedetes (Direito, Medicina, Geologia...) que recebem mais dinheiro, inclusive de empresas privadas interessadas em patrocinar projetos de pesquisa ou com outros objetivos escusos. Os cursos como Matemática e Pedagogia, por exemplo, que não despertam a sanha de empresas, sequer têm ar-condicionado nas salas (para ser justo, uma ou outra sala tem ar). Mas isso não é o mais grave.

Na verdade, o que acho importante relatar aqui são minhas impressões sobre o papel da Universidade, que em nada tem a ver com aqueles princípios que muitos de nós sonhamos e que os professores Paulo e Darcy também vislumbraram. A educação a cada dia é colocada mais no mercado, como ocorre com tudo mais que potencialmente possa ser vendido. O ensino público é depredado em proveito do ensino particular e a Universidade se transforma mais e mais em fábrica de mão-de-obra “qualificada”. E é aqui que gostaria de chegar.

O que mais me indignou na UERJ é essa condição de produtora de mão-de-obra para o mercado. O atendimento ao mercado implica o não atendimento à população que sustenta a Universidade, mas que não colhe os frutos. Outra implicação importante dessa situação é a disparidade existente entre os cursos; enquanto alguns (Direito, Geologia etc.) recebem mais verbas, pois são mais interessantes para o mercado, outros (a maioria) são largados quase a própria sorte, como relatei acima.

E mesmo com todos esses problemas que compartilho com vocês, a Universidade cinicamente criou um programa chamado “UERJ sem muros”. O programa consiste em “abrir” a Universidade ao público, aproximá-la da comunidade circunvizinha durante alguns dias do ano. Ora, a Universidade deve ser sem muros durante todo o tempo e não apenas durante alguns dias escolhidos no ano. Mas para que a Universidade derrube seus muros e se integre à comunidade, é preciso que mude o seu papel, o que infelizmente parece estar longe de acontecer.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Nuvens de tormenta sobre o Irã

Em artigo, intelectual avalia os indícios da preparação de um possível ataque norte-americano ao Irã

Por Noam Chomsky

A grave ameaça representada pelo Irã é considerada uma das piores crises de política externa que a administração Obama enfrentará. O Congresso acaba de enrijecer as sanções contra o país, com punições mais severas para as companhias estrangeiras que comercializarem com o Irã. A administração expandiu ainda a capacidade ofensiva norte-americana na ilha africana Diego Garía, reforçada pelo Reino Unido, que expulsou a população local para que os Estados Unidos (EUA) pudessem construir ali uma grande base de ataque ao Oriente Médio e à Ásia Central.

A marinha estadunidense informou sobre o envio de uma equipe para a ilha, destinada à manutenção de submarinos portadores de mísseis Tomahawk, que, por sua vez, podem transportar ogivas nucleares. De acordo com o relatório da Marinha obtido pelo Sunday Herald (Glasgow), o equipamento militar inclui 387 bombas ‘destruidoras de bunkers’, que podem explodir estruturas subterrâneas reforçadas. "Eles estão ativando a engrenagem para a destruição do Irã", disse o diretor do Centro para Estudos Internacionais e Diplomacia da Universidade de Londres, Dan Plesch, ao jornal. "Os bombardeiros e mísseis de longo alcance estão prontos para destruir 10 mil alvos no Irã, em poucas horas", completa.

A imprensa árabe informa que uma frota americana (com um navio israelense) passou recentemente pelo Canal de Suez a caminho do Golfo Pérsico, onde sua missão era "implementar sanções contra o Irã e controlar os navios que entram e saem deste país". A mídia britânica informou também que Israel e Arábia Saudita estão formando um corredor para um possível bombardeio israelense contra o Irã (o que é negado pelos sauditas).

Retornando de uma visita ao Afeganistão para tranquilizar seus aliados na OTAN - após a demissão do general Stanley McChrystal - o almirante Michael Mulleno, chefe de Estado-Maior conjunto, visitou Israel para se reunir com o chefe das Forças Armadas e Militar de Israel, Gabi Ashkenazi, para manter, assim, o diálogo ‘estratégico’ entre as duas nações. A pauta central da reunião foi "a preparação de Israel e dos EUA ante a possibilidade de um Irã com capacidade nuclear", segundo o jornal Haaretz, que também informou que Mulleno enfatizou: "Eu sempre tento ver os desafios do ponto de vista de Israel".

Alguns analistas descrevem a ameaça iraniana em termos apocalípticos. "Os EUA devem enfrentar o Irã ou entregar o Oriente Médio", disse Amitai Etzioni. Se o programa nuclear do Irã se concretiza, segundo ele, Turquia, Arábia Saudita e outros estados se "movimentarão" em alinhamento a nova superpotência na região. Em uma retórica menos fervorosa, isto significa que uma aliança regional independendo dos EUA poderia se conformar.

Na revista do exército estadunidentes Military Review, Etzioni clama aos EUA não só um ataque contra as instalações nucleares do Irã, mas também contra seus ativos não nucleares, incluindo a infraestrutura do país, ou seja, a sociedade civil. "Esse tipo de ação militar é semelhante às sanções: causar danos visando mudar condutas, ainda que por meios mais potentes", escreve ele.

Uma avaliação oficial sobre a ameaça iraniana foi realizada em um relatório do Departamento de Defesa norte-americano submetido ao Congresso em abril passado. Os gastos militares do Irã são "relativamente baixos em relação ao resto da região", afirma o documento. A doutrina militar do Irã é estritamente "defensiva (...) destinada a retardar uma invasão e forçar uma solução diplomática aos conflitos". Ele ainda afirma que "o programa nuclear iraniano e sua vontade de manter em aberto a possibilidade de desenvolver armas nucleares (são) uma parte central de sua estratégia de dissuasão".

Para Washington, a capacidade de dissuasão do Irã é um exercício ilegítimo de soberania que interfere na geopolítica global e, especificamente, ameaça o controle estadunidense sobre os recursos energéticos do Oriente Médio. Mas a ameaça do Irã vai além da dissuasão. Teerã também está buscando ampliar sua influência na região, em contraposição a invasões e ocupações militares ‘estabilizadoras’ promovidas pelos EUA nos países vizinhos. “Para além destes crimes, o Irã está apoiando o terrorismo por meio do respaldo que dá ao Hezbollah e Hamas - as principais forças políticas no Líbano e na Palestina”, complementa o relatório do Pentágono.

O modelo de democracia no mundo muçulmano, apesar de suas falhas graves, seria a Turquia, onde as eleições são relativamente livres. A administração Obama ficou indignada quando este país se uniu ao Brasil para buscar um acordo com o Irã em relação às restrições em seu programa de enriquecimento de urânio. Os EUA reprimiram rapidamente o acordo, apresentando uma resolução no Conselho de Segurança da ONU com novas sanções contra o Irã – tão sem sentido que foi imediatamente endossada pela China, para quem, na melhor das hipóteses, a resolução evitaria a competição dos países ocidentais pelos recursos do Irã. Assim, sem nenhuma surpresa, Turquia e Brasil votaram contra a medida norte-americana, enquanto o Líbano se absteve.

Estas ações causaram um constrangimento ainda maior em Washington. Philip Gordon, o diplomata da administração Obama em assuntos europeus, advertiu a Turquia que suas ações não agradavam os EUA e que o país deveria "demonstrar seu compromisso de aliada ao Ocidente", segundo informações da Associated Press. A advertência a um aliado crucial na OTAN é uma atitude rara e a comunidade política parece concordar. Steven A. Cook, um especialista do Conselho de Relações Exteriores, afirma que a questão crucial é: "Como manter os turcos no seu caminho?" – ou seja, seguindo ordens como um bom país democrata.

Não há sinais de que outros países da região sejam mais favoráveis às sanções norte-americanas do que a Turquia. Paquistão e Irã se reuniram em Ancara, onde recentemente assinaram um acordo para a construção de um novo gasoduto. Mais preocupante para os EUA é que o gasoduto poderia ser estendido para a Índia. O tratado de 2008, em que os norte-americanos apóiam os programas nucleares da Índia, busca justamente impedir que este país se una ao gasoduto, de acordo com a avaliação de Moeed Yusuf, conselheiro em assuntos do Sul da Ásia no Instituto de Paz dos EUA.

A Índia e o Paquistão são duas das três potências nucleares que se recusaram a assinar o Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP). Israel é o terceiro. Todos eles produziram - e ainda produzem - armamentos nucleares com o apoio dos EUA.

Nenhuma pessoa em sã consciência quer que o Irã ou qualquer outro país passe a desenvolver armas nucleares. Uma maneira óbvia para atenuar ou eliminar esta ameaça é estabelecer uma zona livre de armas nucleares no Oriente Médio. Esta questão foi levantada (de novo) na conferência para o TNP nas Nações Unidas, no início de maio. O Egito - como o presidente do Movimento dos Países Não-Alinhados, que inclui 118 países - propôs que a Conferência aprovasse um plano para iniciar a negociação para um Oriente Médio livre de armas nucleares em 2011, como foi feito pelo Ocidente, incluindo os EUA, em 1995. Washington ainda esta formalmente de acordo, mas insiste que Israel seja isento de cumprir o acordo, e não deu qualquer indicação de que o próprio EUA irá fazê-lo.

Ao invés de tomar medidas concretas para combater a ameaça de proliferação nuclear no Irã ou outros países, os EUA estão se movimentando para reforçar seu controle nas principais regiões produtoras de petróleo no Oriente Médio, usando inclusive a violência, se não alcançam seus objetivos por outros meios.

Fonte: site da revista Caros amigos



MINHAS REFLEXÕES

Como podemos ver pela leitura do artigo do professor Chomsky, os EUA e o seu capacho Estado de Israel podem ter um sombrio plano de ataque militar contra o Irã, o mais novo país escolhido pelos yankees como inimigos da Democracia e do "bem-estar mundial". Pois bem: se forem verdadeiros os planos dos EUA de invadir o Irã o motivo seria somente o de que o país muçulmano não tem respeitado os "acordos internacionais" de não proliferação de armas nucleares? Creio que não. Lembremos que o capital está mergulhado numa crise de superprodução e uma das saídas clássicas da burguesia é a guerra, que é a maneira mais rápida de destruir a abundância e, com isso, abre-se a possibilidade de uma nova rodada de crescimento das forças produtivas do capital.
Todavia, acho improvável que os EUA recorram a guerra, pois já estão atolados em duas (Afeganistão e Iraque) e seria muito difícil abrir outra frente. Também é importante lembrar que uma guerra de grandes proporções poderia ameaçar nosso futuro enquanto espécie, por conta das armas nucleares.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Enxurrada de água e de descaso do Estado no Rio de Janeiro




Desde segunda-feira cai uma chuva torrencial no Rio de Janeiro e, com ela, caem casas, famílias, sonhos e esperanças. Caem também arrogâncias, fingimentos, máscaras. Segundo a Defesa Civil o nº de mortos chega a 110 e provavelmente aumentará por conta dos desaparecidos. São muitos desabrigados, desalojados, ilhados; vários bairros ficaram embaixo d’água; trabalhadores que não conseguiram voltar para casa na segunda-feira dormiram nos ônibus, nas ruas, no trabalho e os que tinham mais dinheiro pernoitaram em hotéis. Na terça-feira, escolas, universidades, prédios públicos e empresas não abriram as portas; o transporte, que já é precário, colapsou; ônibus não conseguiam transitar, o metrô continuou a circular, todavia com atrasos, várias estações de trem estão fechadas e vários vôos estão atrasados ou foram cancelados.

Diante dessa situação catastrófica, cabe-nos perguntar o motivo de o Rio de Janeiro ter se comportado tão mal frente à chuva e podemos perceber basicamente duas opiniões distintas:

1) O primeiro grupo é o dos conservadores, que colocam a culpa no excesso de chuva, no acúmulo de lixo, que impedem o escoamento da água, e nas pessoas que constroem suas casas precariamente em áreas de risco.

2) O segundo grupo diz que a culpa é do Estado.

Vale, pois, analisar as duas proposições, a fim de tirar algumas conclusões.

A primeira sentença é enganosa, visto que a água e o lixo não podem ser apontados como causa e, antes de culpar as pessoas que constroem casas em áreas de risco, como se fossem loucas, é preciso saber por que levantam suas casas em tais locais e não em outros “mais seguros”. A segunda sentença é verdadeira e portanto merece maior atenção.

Uma das características mais marcantes do subdesenvolvimento é a urbanização caótica, e como o Rio de Janeiro faz parte do Brasil, que é um país subdesenvolvido, não foge a essa lógica. A favelização foi e é intensa, ocasionada por diversos fatores, entre os quais: falta de política pública concreta de habitação, desemprego, informalidade, especulação imobiliária e concentração fundiária no campo. Atrelado a favelização existe a ineficiente e insuficiente ampliação e melhoria da infra-estrutura, como o sistema de drenagem. E, na confluência desses fatores com a grande quantidade de chuva, o resultado não poderia ser outro, senão o descrito acima. Se o Estado fizesse minimamente o seu papel, a situação hoje seria outra.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

A história do Haiti é a história do racismo na civilização ocidental

Por Eduardo Galeano, em Resumen Latinoamericano, via Resistir.info

A democracia haitiana nasceu há um instante. No seu breve tempo de vida, esta criatura faminta e doentia não recebeu senão bofetadas. Era uma recém-nascida, nos dias de festa de 1991, quando foi assassinada pela quartelada do general Raoul Cedras. Três anos mais tarde, ressuscitou. Depois de haver posto e retirado tantos ditadores militares, os Estados Unidos retiraram e puseram o presidente Jean-Bertrand Aristide, que havia sido o primeiro governante eleito por voto popular em toda a história do Haiti e que tivera a louca ideia de querer um país menos injusto.

O voto e o veto
Para apagar as pegadas da participação estadunidense na ditadura sangrenta do general Cedras, os fuzileiros navais levaram 160 mil páginas dos arquivos secretos. Aristide regressou acorrentado. Deram-lhe permissão para recuperar o governo, mas proibiram-lhe o poder. O seu sucessor, René Préval, obteve quase 90 por cento dos votos, mas mais poder do que Préval tem qualquer chefete de quarta categoria do Fundo Monetário ou do Banco Mundial, ainda que o povo haitiano não o tenha eleito nem sequer com um voto.

Mais do que o voto, pode o veto. Veto às reformas: cada vez que Préval, ou algum dos seus ministros, pede créditos internacionais para dar pão aos famintos, letras aos analfabetos ou terra aos camponeses, não recebe resposta, ou respondem ordenando-lhe:
– Recite a lição. E como o governo haitiano não acaba de aprender que é preciso desmantelar os poucos serviços públicos que restam, últimos pobres amparos para um dos povos mais desamparados do mundo, os professores dão o exame por perdido.

O álibi demográfico
Em fins do ano passado, quatro deputados alemães visitaram o Haiti. Mal chegaram, a miséria do povo feriu-lhes os olhos. Então o embaixador da Alemanha explicou-lhe, em Porto Príncipe, qual é o problema: – Este é um país superpovoado, disse ele. A mulher haitiana sempre quer e o homem haitiano sempre pode.

E riu. Os deputados calaram-se. Nessa noite, um deles, Winfried Wolf, consultou os números. E comprovou que o Haiti é, com El Salvador, o país mais superpovoado das Américas, mas está tão superpovoado quanto a Alemanha: tem quase a mesma quantidade de habitantes por quilômetro quadrado.

Durante os seus dias no Haiti, o deputado Wolf não só foi golpeado pela miséria como também foi deslumbrado pela capacidade de beleza dos pintores populares. E chegou à conclusão de que o Haiti está superpovoado... de artistas.

Na realidade, o álibi demográfico é mais ou menos recente. Até há alguns anos, as potências ocidentais falavam mais claro.

A tradição racista
Os Estados Unidos invadiram o Haiti em 1915 e governaram o país até 1934. Retiraram-se quando conseguiram os seus dois objetivos: cobrar as dívidas do Citybank e abolir o artigo constitucional que proibia vender as plantations aos estrangeiros. Então Robert Lansing, secretário de Estado, justificou a longa e feroz ocupação militar explicando que a raça negra é incapaz de governar-se a si própria, que tem "uma tendência inerente à vida selvagem e uma incapacidade física de civilização". Um dos responsáveis pela invasão, William Philips, havia incubado tempos antes a ideia sagaz: "Este é um povo inferior, incapaz de conservar a civilização que haviam deixado os franceses".

O Haiti fora a pérola da coroa, a colônia mais rica da França: uma grande plantação de açúcar, com mão-de-obra escrava. No Espírito das leis, Montesquieu havia explicado sem papas na língua: "O açúcar seria demasiado caro se os escravos não trabalhassem na sua produção. Os referidos escravos são negros desde os pés até à cabeça e têm o nariz tão achatado que é quase impossível deles ter pena. Torna-se impensável que Deus, que é um ser muito sábio, tenha posto uma alma, e sobretudo uma alma boa, num corpo inteiramente negro".

Em contrapartida, Deus havia posto um açoite na mão do capataz. Os escravos não se distinguiam pela sua vontade de trabalhar. Os negros eram escravos por natureza e vagos também por natureza, e a natureza, cúmplice da ordem social, era obra de Deus: o escravo devia servir o amo e o amo devia castigar o escravo, que não mostrava o menor entusiasmo na hora de cumprir com o desígnio divino. Karl von Linneo, contemporâneo de Montesquieu, havia retratado o negro com precisão científica: "Vagabundo, preguiçoso, negligente, indolente e de costumes dissolutos". Mais generosamente, outro contemporâneo, David Hume, havia comprovado que o negro "pode desenvolver certas habilidades humanas, tal como o papagaio que fala algumas palavras".

A humilhação imperdoável
Em 1803 os negros do Haiti deram uma tremenda sova nas tropas de Napoleão Bonaparte e a Europa jamais perdoou esta humilhação infligida à raça branca. O Haiti foi o primeiro país livre das Américas. Os Estados Unidos haviam conquistado antes a sua independência, mas tinha meio milhão de escravos a trabalhar nas plantações de algodão e de tabaco. Jefferson, que era dono de escravos, dizia que todos os homens são iguais, mas também dizia que os negros foram, são e serão inferiores.

A bandeira dos homens livres levantou-se sobre as ruínas. A terra haitiana fora devastada pela monocultura do açúcar e arrasada pelas calamidades da guerra contra a França, e um terço da população havia caído no combate. Então começou o bloqueio. A nação recém nascida foi condenada à solidão. Ninguém lhe comprava, ninguém lhe vendia, ninguém a reconhecia.

O delito da dignidade
Nem sequer Simón Bolívar, que tão valente soube ser, teve a coragem de firmar o reconhecimento diplomático do país negro. Bolívar havia podido reiniciar a sua luta pela independência americana, quando a Espanha já o havia derrotado, graças ao apoio do Haiti. O governo haitiano havia-lhe entregue sete naves e muitas armas e soldados, com a única condição de que Bolívar libertasse os escravos, uma ideia que não havia ocorrido ao Libertador. Bolívar cumpriu com este compromisso, mas depois da sua vitória, quando já governava a Grande Colômbia, deu as costas ao país que o havia salvo. E quando convocou as nações americanas à reunião do Panamá, não convidou o Haiti mas convidou a Inglaterra.

Os Estados Unidos reconheceram o Haiti apenas sessenta anos depois do fim da guerra de independência, enquanto Etienne Serres, um gênio francês da anatomia, descobria em Paris que os negros são primitivos porque têm pouca distância entre o umbigo e o pênis. Por essa altura, o Haiti já estava em mãos de ditaduras militares carniceiras, que destinavam os famélicos recursos do país ao pagamento da dívida francesa. A Europa havia imposto ao Haiti a obrigação de pagar à França uma indenização gigantesca, a modo de perdão por haver cometido o delito da dignidade.

A história do assédio contra o Haiti, que nos nossos dias tem dimensões de tragédia, é também uma história do racismo na civilização ocidental.

Eduardo Galeano é escritor

Fonte: http://carosamigos.terra.com.br/

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Pêsames de um cidadão latino-americano ao povo haitiano.

Mais uma desgraça se abateu sobre o povo do Haiti: um terremoto. A previsão é de que existam milhares de mortos e outros tantos feridos, desabrigados e desalojados num dos países mais pobres e mais saqueados pelo imperialismo. E este, através do Banco Mundial, irá “doar” dinheiro para ajudar aquele país. Contradição grotesca.
Deixando um pouco a revolta de lado (pois não é o objetivo deste post), quero de coração aberto me solidarizar com o povo haitiano, pois infelizmente é o máximo (acho) que posso fazer de tão longe. Tenho certeza que vão superar mais essa adversidade.

Sejam fortes!

Um fervoroso abraço!

José Neto

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

25 de dezembro: Dia Mundial do Consumismo

Mais um 25 de dezembro se passou. Milhões de pessoas lotaram os shoppings centers e mercadões populares de todo o Brasil para torrar seu suado 13º salário e começar (ou continuar) o endividamento para o novo ano. Segundo a ALSHOP (Associação Brasileira dos Lojistas de Shopping Centers), as vendas de final de ano subiram 11,26%, o que reforça o discurso otimista dos propagandistas de plantão de que a crise estrutural do Capitalismo foi embora. E, no meio de toda essa euforia de consumo, me perguntei: O que mesmo se comemora no dia 25 de dezembro? Alguém respondeu: O Natal; perguntei novamente: Natal é um nome bonito dado para o Dia Mundial do Consumismo? Fui repreendido: Claro que não; no Natal se comemora o nascimento de Jesus, Aquele que morreu para nos salvar...
A partir de então, comecei a refletir sobre o sentido do Natal, a quem serve, o que representa, entre outras coisas que normalmente os desocupados pensam. Cheguei a conclusão, após algum tempo de devaneios, que o Natal só serve a um pequeno grupo de pessoas: Os donos das mercadorias que são vendidas. Quanto ao sentido e ao que representa o Natal, não importa, saiu de moda; deixa pra lá!